quarta-feira, 8 de novembro de 2006

Casa de Canelas, Quintela de Azurara


Hoje decidi colocar um texto sobre um elemento patrimonial da vizinha aldeia de Canelas, da freguesia de Quintela de Azurara.

Os vestígios mais antigos que se conhecem na povoação de Canelas é um troço de calçada e uma ponte indicada por alguns autores como sendo romanas (Vaz, 1997, p. 75). É precisamente junto desta via, sobre um afloramento roqueiro que se implantam as “Casas de Canelas”. Estes vestígios não nos permitem afirmar que existiu povoamento romano nesta aldeia, visto que até ao momento não foram encontrados quaisquer vestígios da ocupação humana no local.
No entanto, para o períodos medieval, temos já não só vestígios medievais como documentos que atestam a ocupação deste local.
No que diz respeito aos vestígios arqueológicos, foram identificados junto às “Casas de Canelas” fragmentos cerâmicos que numa primeira análise apontam para uma cronologia medieval. Por outro lado a própria implantação da casa sobre a rocha indicia a sua fundação medieval, visto que é típico desta época a implantação dos “prédios urbanos” sobre a rocha de forma a deixar disponível os “prédios rústicos” para a agricultura.
Relativamente aos documentos, a primeira referência surge-nos nas Inquirições de 1258. Segundo este documento a “vila” de Canelas era uma cavalaria foreira ao Rei, por uso e foro de Zurara, que fora trazida por homens vilãos, tendo sido depois no Reinado de D. Sancho I comprada por Fernando Canelas. Este Fernando Canelas, aqui deverá ter tido a sua casa, pois desta terra tomou o nome, tendo alargado o seu património através da compra de outra propriedades pelas terras de Zurara, Tavares e Penalva. (Nóbrega, 2002).
O conjunto objecto deste estudo deverá ter sido construído nesta época, séc. XII/XIII, tendo sofrido algumas alterações no séc. XV/XVI, como sejam a inclusão de uma janela de estilo manuelino, cujos ornatos aplicados infelizmente já não se conservam. Como já dissemos estas casas encontra-se implantada sobre a rocha, tinha dois pisos interligados por um lanço de escadas exteriores.
A casa onde se encontra a janela manuelina é que se encontra em melhor estado de conservação. De dois pisos, a janela, encontra-se no segundo piso ao qual se tem acesso por uma escadaria lateral. O piso inferior, pela sua configuração e pelo diminuto espaço útil, devido aos afloramentos onde está assente a casa, não deverá ter sido usado para habitação. Talvez o primitivo acesso ao piso superior fosse interior, sendo a porta que se encontra na fachada a entrada principal.
A segunda casa, encontrava-se parcialmente adoçada a esta, formando um “L”. Restam apenas duas paredes, conservando-se numa delas uma janela, com conversadeiras.
A técnica construtiva das duas casas é similar, sendo as paredes constituídas por pedras de tamanho médio sobrepostas.
Que papel terá tido estas casas na História de Canelas?
Serão as casas dos descendentes de Fernando Canelas?
Anabela Cardoso (1994, p. 48) coloca a questão de esta casa ter pertencido a Manuel Cabral de Albuquerque que em 1783 surge como “Senhor de importantes bens em Canelas e Tenente de Milícias no mesmo local. Ao contrário dos seus antecessores estabelece residência naquela aldeia e é na “Casa de Canelas” que vão nascer os seus cinco filhos”.
Apesar das incertezas que envolvem este conjunto é indiscutível a sua importância para a História de Canelas e do concelho de Mangualde. O desenvolvimento urbano da aldeia e o abandono poderão a qualquer momento fazer desaparecer este marco histórico. Daqui a razão de ser da classificação deste conjunto como de interesse municipal requerida pela Associação do Rancho Folclórico "Os Azuraras" à Câmara Municipal de Mangualde em Maio passado e cuja abertura do processo de instrução ainda não foi deliberada.

Referências Bibliográficas
CARDOSO, Anabela dos Santos Ramos (1994) – Casas Solarengas no concelho de Mangualde. Mangualde: Câmara Municipal de Mangualde e Associação Cultural Azurara da Beira. (Terras de Tavares e Azurara. 5)
NÓBREGA, Pedro Pina (2003) - A presença romana nos concelhos de Mangualde e Penalva do Castelo [on-line]. Lisboa: [s.n.] [consultado em 10-05-2006]. Trabalho apresentado à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Disponível em http://pedropinanobrega.no.sapo.pt/tampr.html
NÓBREGA, Pedro Pina (2002) - O Povoamento medieval de Mangualde e Penalva do Castelo: Contributo dos vestígios arqueológicos e das Inquirições de 1258 [on-line]. Lisboa: [s.n.] [consultado em 10-05-2006]. Trabalho apresentado à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Disponível em <http://pedropinanobrega.no.sapo.pt/thmpii.html>
VAZ, J. L. da Inês (1997) - A Civitas de Viseu: Espaço e Sociedade. Coimbra: Comissão de Coordenação da Região Centro.

9 Comments:

Al Cardoso said...

Caro Pina Nobrega:

Estes seus trabalhos sao excelentes, embora relacionados com a area da sua residencia e trabalho, trazem imformacoes que me interessam a mim tambem.
Irei enviar-lhe um email com algumas questoes, para as quais pedia a sua ajuda.

Continuacao de boa semana.

Anónimo said...

As páginas de temática regionalista interessam-me de sobremaneira. Percorri esta atentamente e conclui pela sua óptima qualidade, sóbria e elegante estilo, e pela qualidade informativa, todo conforme uma acertada noção de dedicação, sempre de relevar, e excelente conteúdo. Parabéns.

Anónimo said...

Muito bom o trabalho!
Aguardo, com inresse, trabalhos idênticos sobre Penalva.
Cumprimentos

PPN said...

Caro Gabriel

Estão na calha, quer no âmbito do projecto da CDU em Real "Valorização do Património e História locais" quer sobre o património de outras freguesias.

Anónimo said...

Olhando a Ribeira.
Uma vez que o Pina Nóbrega , é morador da Ribeira da freguesia de Real, gostaria de saber se a "sua Ribeira" ficando muito para lá do rio ludares, alguma vez pertenceu ao concelho de Mangualde.
Pois na obra de Valentim da Silva em Concelho de Mangualde, no mapa expresso e referente ao concelho verifica-se a existência da Ribeira e de Sandiães como pertencendo a Mangualde. As minhas desculpas pelo incómodo, Jf

PPN said...

Caro JF.
A Ribeira não fica muito para lá do RIo Ludares, não chega a ser 1 Km.

No entanto nunca encontrei nenhuma referência à Ribeira em terras de Azurara. Nas Iquirições de 1258 a Ribeira é inquirida juntamente com outras terras de Penalva e não de Mangualde.
Haverá a hipótese de a primitiva ribeira ter sido onde no Moinhos, junto à Ponte mas do outro lado do Rio Ludares.
Em que página da monografia do Valentim da Silva está esse mapa?

Anónimo said...

amigo pedro quero dar-te os parabens pelo magnifico trabalho que estas a desenvolver ,pois este post sobre canelas é um exemplo, espero que continues com essa dinamica e força.
um abraço
jorge

Anónimo said...

Caro Pina Nóbrega.
Em relação á sua pergunta.
"Em que página da monografia do Valentim da Silva está esse mapa?"
Passo a indicar as páginas 130 e 131. Entre as mesmas encontra-se o mapa, mais ou menos formato A4.
Também me apraz informar que estou a referir a Primeira edição, desconhecendo se a 2ª também possui o mesmo mapa.
Cumprimentos jf

PPN said...

Caro JF

A Edição da Monografia de Mangualde que tenho acesso não é a primeira. A ela tive acesso em Lisboa, mas não me lembro de nenhm mapa no seu interior.
No entanto na próxima ida a Lisboa verei esta edição para ver em que contexto o Valentim da Silva coloca Ribeira e Sandiães em Mangualde.

Caso queira, envie o seu mail para pedropinanobrega@sapo.pt que eu depois responderei para ele.