segunda-feira, 14 de maio de 2007

Caminhos dos Galegos II

Deixo-vos um texto publicado no Boletim Municipal de Penalva do Castelo, quando ele era um boletim com algum conteúdo e periodicidade regular, e não apenas um boletim para sair em final de mandato com todas as obras feitas e por fazer.

Este artigo foi escrito pelo Dr. Paulo Celso Fernandes Monteiro, licenciado em História e mestre em Cultura e Formação Autárquica, que na altura prestava serviço na Câmara Municipal de Penalva do Castelo. Foi publicado n.º 3 do referido boletim correspondente ao 1º trimestre de 2000, a páginas 30 e 31.


PATRIMÓNIO
MARECO E O CAMINHO DOS GALEGOS

A freguesia de Mareco situa-se numa delicada encosta na periferia do concelho de Penalva, fazendo fronteira com o concelho de Tavares, extinto pela reforma administrativa do liberalismo.
Os documentos agora apresentados indicam-nos que a freguesia de Mareco foi propriedade da Ordem de Santiago, sendo os seus moradores reguengueiros encabeçados.1 No entanto nesta altura os privilégios concedidos, outrora aos seus habitantes, já não eram cumpridos. Se a isto adicionarmos os antigos caminhos rurais, em lajedo granítico, desgastado pelos inúmeros viajantes que por aqui passavam e a toponímia do trilho, é bem possível que esta povoação se encontre em plena rota dos peregrinos portugueses em busca de Santiago de Compostela.
Em 1527, Mareco possuía 32 moradores2, mas o Padre António Carvalho, afirmava, no inicio do séc. XVIII, que a referida freguesia tinha 70 vizinhos e possuía 180 pessoas maiores e 22 menores, perfazendo um total de 202 habitantes (Costa, 1706, 220). A memória paroquial elaborada pelo sacerdote António Pereira atribuía à freguesia 70 vizinhos e 180 pessoas.3 Se atendermos aos resultados demográficos das outras terras do concelho, vemos que já na época Mareco era a freguesia com menor número de habitantes. Em Mareco ainda existe uma casa que na ombreira da porta possuí gravada uma estilizada cruz de Santiago indicando que este imóvel era pertença da Ordem.
O caminho dos Galegos é constituído por um excelente lajeado de acentuada antiguidade, provocada pelo desgaste das múltiplas passagens dos veículos, marcando na pedra granítica os seus rodados. Em alguns locais os fossos dos rodados chegam a ter cerca de 20 cm, mostrando o intenso tráfego que outrora teve. A denominação é bastante curiosa e se o topónimo poderá advir do local chamado Moinhos dos Galegos (junto da ribeira de Ludares, na confluência dos concelho de Penalva do Castelo e com os de Mareco), também é possível que seja derivado dos peregrinos que iam para a Galiza, ode se localizava o Santuário de Compostela.4
Logo no seu inicio podemos ver uma pequena alminha esculpida em granito da região, representativa de uma piedosa fé popular, típica dos peregrinos e dos romeiros. Outro monumento tipologicamente semelhante surge-nos ainda dentro do concelho de Penalva do Castelo, junto ao pontão que separa as Terras de Penalva das de Tavares.
Por causa da concentração/escoamento das águas pluviais em certos locais utilizaram-se dois procedimentos aquando da sua construção. Em alguns sítios o caminho foi alteado em relação aos terrenos adjacentes, enquanto n’outros se procedeu à drenagem das águas através da criação de pequenas condutas.
Parte deste itinerário irá ser recuperado através do Programa Centro Rural do Alto Dão, gerido ela A.D.D. – Associação de Desenvolvimento do Dão. Esta intervenção inovadora está a ser efectuada pela primeira vez no nosso país e incidirá prioritariamente na consolidação e recuperação do lajeado, dos muros de suporte, na sinalização e divulgação do percurso.
As suas características fazem dela um exemplo na recuperação e consolidação das antigas redes viárias de Portugal, muito especialmente nos trilhos de Peregrinação.
A C. M. de Penalva do Castelo em colaboração com a Região de Turismo Dão-Lafões pretendem implantar no Caminho dos Galegos um circuito de turismo pedestre.
No caso do município Penalvense pretende-se com a criação deste tipo de circuitos contribuir significativamente para o incremento turístico e fomento da prática desportiva, proporcionando ao turista uma maior aproximação ao meio rural, de uma forma consciente e pedagógica.
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1­ – T.T. – Dicionário Geográfico, vol. 22, m. 52, f. 341, rolo 350.
2 – T.T. – Cadastro da População do Reino, Núcleo Antigo, n.º 825, doc. 1527, f. 103
3 – T.T. – Dicionário Geográfico, vol. 22, m. 52,f. 341, rolo 35o
4 – Será bom lembrarmos que os naturais da Galiza são denominados de Galegos.

2 Comments:

Anónimo said...

Interessante e louvável estudo! Muito obrigado por o divulgar.
O estudo dos caminhos de Santiago na n/ região é ainda muito incipiente. Admite-se que um dos percursos passe por Figueiró da Granja (com eventual ida à capela que terá existido no Castro de Santiago), o que é plausível uma vez que ali passa uma das principais vias de comunicação Sul / Norte da região (Fornos - Aguiar da Beira - ...), também utilizada nas rotas de transumância.
Não conhecia este caminho de Mareco. À partida, a hipótese de o topónimo se referir a peregrinos de Compostela (chamando-lhes "galegos"(?)) parece-me algo "fraca", na ausência de outros indícios que a abonem, tanto mais que existe o topónimo relacionado "Moinho dos Galegos". Por outro lado, a existência de alminhas é vulgar nos caminhos e encruzilhadas da região, sem relação necessária com percursos de romeiros.
Em todo o caso, é uma hipótese interessante, que merece naturalmente ser aprofundada.
Especialmente interessantes e dignas de realce são as iniciativas que têm sido desenvolvidas no sentido de preservar, divulgar e de manter "vivo" este património.
Parabéns aos responsáveis!

Anónimo said...

Perdoar-me-ão que me refira novamente a Fornos de Algodres, mas é a zona que melhor conheço.
Um dos locais que muito provavelmente integraria os caminhos de Santiago na região é a travessia do Mondego na ponte de Juncais. Recordo, a propósito, que a freguesia de Juncais tem por orago Santiago, sendo também chamada de Santiago de Juncais.